se nós pintassemos uma cidade seria em cores terra


Se eu, a sara e a brigitte pintássemos uma cidade seria em tons terra.
bem, se pudéssemos pintar alguma coisa, nunca seria uma cidade.
escolhíamos casinhas pequeninas. talvez de madeira.
e se calhar, se pintássemos, já não pintávamos só de cores terra.

mas ainda estavam no meio das árvores. o chão cheio de flores. com alpendres onde se podia tomar o pequeno almoço ao sol. onde se ouvia musica de um radio qualquer. onde os cães corriam pelos campos. onde se viam bicicletas paradas junto aos muros. onde se podia ir a pé para a praia. onde havia bolo quente de maça e canela para o lanche. e chá.

certeza, certeza, era a cor da terra. nas nossas mãos. e nos nossos pés. de tanto dançarmos descalças.

era aqui que tu vivias, sara



Sara, se tu vivesses no meu centro de léon, esta seria a tua casa. a da direita.

tens a 3 minutos a pé o mercado e a 1 minuto a pé as ruas cheias de tasquinhas com tapas.

Ps: foi esta a casa que te enviei por sms. mas que não chegaste a receber.

o vício da teresa



A caminho dos pirineus ficámos em léon. onde jantámos e dormimos.
quando chegámos existiam toldos verdes a ocuparem a praça.
vazios. a prometerem.
de manhã, esta era a vista do nosso quarto.

lembrei-me de ti, teresa.
e fotografei. várias vezes.
das duas janelas.
e escolhi esta.

aqui, podias vir aos sábados de manhã.
à fruta, aos legumes, ao mel, ás flores...

podias trazer a leonor, que com tantas cores, tantas bancas, tantas escolhas,
distraía-se deixando-te distraíres-te também.

um mercado. no meio de uma praça. tão bonita.
feito de certeza a pensar em ti.
sem saberem.

deixam-me viver com o meu melhor

a importância que as pessoas têm na minha vida só pelo facto de ao lado delas eu gostar de mim.

disponibilidade mentirosa

fases de loucura de um passado de liberdades a mais.
depois de divorcios em abraços apertados ao som dos tangos. e das kizombas.
derrapagens em todas as drogas e vícios fabricados nas máquinas da minha cabeça.
com tudo á flor da pele. com a flor na pele...
pessoas escolhidas pela sua indisponibilidade.
o meu espaço um direito, um dever.

depois...
as minhas vontades dissipadas pelo tempo.
diminuídas, reduzidas, anuladas.
porque quis. porque aconteceu.
as prioridades baralhadas, desorientadas, reorganizadas
outras fases, com outras máquinas a laborarem ao som de outras musicas.
e as mesmas pessoas, com as mesmas indisponibilidades,
a baterem á minha porta.


sair de mim

vou sair de mim, e tirar umas férias.

já volto.

sem palavras

agora não tenho absolutamente nada para dizer.

por isso mesmo, achei importante vir aqui dizer isto.

epoca da procriação

não me resta a menor dúvida que com o sol chega a época da procriação.
não a necessidade de ter filhos. do lar. do ninho.
não. esqueçam isso. nada disso.
estou mesmo a falar de todos os procedimentos que antecedem tudo isto.
nestes dias eu deixo de ser eu. definitivamente.
sinto-me uma marioneta cheia de fios, a ser manobrada pelo sol.
coberta de asas coloridas como um pavão cuja disponibilidade se apresenta de braços abertos.
o corpo apetece sair a dançar
nu e descalço.
a cabeça não está aqui. nem a consigo apanhar em parte alguma.
viaja como louca pelos sonhos em areais, e campos, e mares de águas quentes.
sentada no sitio onde estou. presa a uma responsabilidade falhada.
viajo pela paixão louca de saleiros que alguém se lembrou de fotografar
tão surreal que prendeu a minha atenção.
viajo por conversas escritas, faladas, sussurradas, gritadas, pensadas.
viajo com os abraços. dados ou imaginados.
viajo pelos corpos.
pelo cheiro.
o sol acorda-me e domina-me
o sol modifica-me e liberta-me.
e comigo arrasta aqueles de quem me lembro.



volta chuva, estás perdoada...



eu gosto

eu realmente gosto muito mais de ler o jornal de trás para a frente.

um dos meus defeitos

a última palavra tem que ser sempre minha. sempre.
mesmo quando já não há absolutamente mais nada a dizer.
ou quando o que há a dizer não interessa a absolutamente mais ninguém.

a casa ventosa da minha alma

a falta de admiração pela degradação.
os braços escuros de picados não me dão pica.
as mantas queimadas de cigarros adormecidos entristecem-me.
os olhos profundos perdidos não os encontro.
limões, colheres, seringas, pratas, nunca fizeram parte dos meus sonhos.
corpos estendidos nas ruas, marcados, adormecidos quase mortos.
sombras cambaleantes encostadas ás paredes do metro.
olhares perdidos em parte alguma.
t-shirts sujas de um keith richards no altar.
o rock n roll no ar como religião a correr nas veias.
a admiração secreta de quem conhece o mundo. o submundo. a quase morte.
o sexo sem parar, sem estar lá. vazio.
o egoísmo. o silencio. o eu. o eu. o eu.
o desespero. a dor. o choro. a arrogância. o eu. o eu. o eu.
as dores de barriga. do coração. os suores.
as dores nas costas. a mentira. os cansaços.
o fígado. as hepatites. o álcool.
a morte. as doenças. a morte.
o eu. o eu. o eu.
os braços picados. as pernas imóveis. a pele amarela. as manhas passadas numa cama com o formato já do corpo.
as viagens de carro para bairros proibidos como raptos indesejados.
as historia contadas cheias de um orgulho de uma vida envergonhada.
as historias contadas a rir, que ouvidas me fazem chorar. E que envaidecem tantos seguidores cheios de admiração.
historias ouvidas como bíblias sagradas, digeridas e aplicadas, mas que me afastam. me desiludem. me desinteressam. me enfraquecem.
doenças escolhidas.
porque sim. porque querem. porque gostam. e muitas vezes porque também não conseguem que seja de outra maneira.
vidas negras ao som da música, pela música, pelos ídolos, pela amizade, pelas viagens que fazem juntos dentro das cabeças. com cores, com formas, com sensações e sentimentos que se não fosse assim nunca seriam deles.
que os tornam unidos, especiais, diferentes. que os transportam a um universo que admiram, que respeitam, e que desconhecem.

ou desconheço eu. e enganei-me. e algures pelo meu caminho, apanhei o comboio errado.




AS MINHAS FRAQUEZAS DESTROEM-ME

l'amour

não.
ela não está a morrer ainda.
ainda não se sente. a morrer.
o seu corpo ainda não se apaga como as tochas ao vento.
as mãos dela ainda acordadas querem sentir as dele.
os braços por abraçar como troncos entrelaçados numa árvore qualquer.
os pés descalços mergulhados na areia como serpentes enroscadas.
os corpos aquecidos. um pelo outro. e pelo sol. e pelo sal.
não são um. são dois. mas são um. entre os cabelos que se soltam e se agarram e se cheiram.
entre as costas que se deitam e levantam e se tocam.
entre as pernas que se enroscam e sobrepõem e aparecem e desaparecem.
e são um. e são dois. e são um.

para M. M de mãe. M de mulher. M de marida.

M, este é para ti.
porque te fiz chorar.
porque os teus olhos incharam, ao ponto de nem conseguires ver a fantástica.
que já está no fim á mais de um mês.
porque choraste desesperadamente. mas nos braços de alguém, que estava ao teu lado, finalmente, ao fim de tantos anos.
tens alguém ao teu lado. nos braços de quem podes chorar. finalmente.
choraste porque te falei coisas que te doem.
porque te lembrei de coisas que não te queres lembrar.
coisas que queres esquecer.
culpaste-me por te ter dito o que sentia.
como sempre te disse ao longo destes anos. em que te vi. em que te senti. sempre a morrer. aos bocadinhos.
em que talvez tu nuca tenhas tido a capacidade de me ouvir. a não ser agora.
e por isso só agora te tenha magoado.

M de mãe, M de mulher, M de marida.
posso voltar a fazer-te chorar.
podes vir a perder mais um episódio da fantástica que está quase acabar, mas que ainda deve durar mais uns dias,
podes voltar a acusar-me
podes até me odiar, por instantes.
mas vou voltar a dizer-to.

foste casada e tiveste uma filha.
não te conheci nessa altura.
viajaste para moçambique onde toda a tua vida se transformou.
onde parte de ti acordou e outra parte morreu para sempre.
divorciaste-te. porque optaste pela verdade.
deixaste a filha com o pai. pelo bem dela. por ela.
contaste-me tu.
nada sabia de ti nessa altura.
só mais tarde.
já tinhas uma casa em gaia. que um dia terias que vir a deixar.
uma paixão desequilibrante.
profundamente desequilibrante.
que te viria a maltratar, humilhar, desprezar, abandonar.
um trabalho que ainda te dava prazer, mas que te viria a dispensar.
relações perdidas, desamadas, que agarravas desesperadamente, pedindo apenas um pouco de amor.
que nunca nenhuma te deu.

vi-te chorar. dias a fio.
a tua filha viu-te chorar dias a fio.
vi-te dormir, tardes seguidas depois de a ires buscar á escola, enquanto ela se entretinha sozinha na minha sala.
vi-te dormir no carro, enquanto ela esperava que o pai a fosse buscar.
vi-te sair as 2h, 3h, 4h, da manha, para ires ter com quem não te merecia.
e ela ficava a dormir com a avó.
e com a avó ficava enquanto dormias no dia a seguir.
e vimos-te chorar, novamente.

E vi-nos ás duas a afundar-nos numa tristeza profunda.
incapaz de nos ajudarmos.
atendi-te o telefone vezes demais, enquanto atravessavas a ponte do douro, a dizeres que não querias mais viver.
ouvi-te arranjares as mais variadas desculpas para ires viver para outros países.
vi-te desequilibrada. carente. infeliz.
vi-te num desamor tão grande tão profundo.

mas vi-te sempre também a despedires-te da tua filha ao telefone com um "a mamã ama-te muito"
em que me faria questionar se estria a dar ainda a novela da sic.
nunca vi a minha mãe a chorar. ou foram raríssimas as vezes que a vi. mas nunca me disse que me amava muito. nunca.
vi-te dormir com a tua filha vezes sem conta abraçada a ela. e a dizeres que aquilo era o melhor do mundo.
ouvi-te, sempre, em qualquer situação, pedires, para no caso de algo te acontecer, para a gente dizer á tua filha que ela era a pessoa mais importante do mundo para ti. E que por ela tu morrerias.

Eu sei disso. eu acredito nisso.

E sei que tu és um M de mãe, um M de mulher e um M de marida como ninguém.

mas és um M com uma asa maior do que a outra. E quando voa.... alto, e rápido... desorienta-se....

Olha para ti agora.
és amada. por um homem como mereces ser.
és amada pelos amigos. que te respeitam. que te admiram.
que te dizem a verdade, porque acreditam, sinceramente, que ela no fundo te faz bem.
tens uma filha que está a aprender a conhecer a mãe.
a criar laços novos.
baseados em coisas novas. em coisas fortes. seguras.
baseados em risos e alegrias.
tens um trabalho onde és admirada. onde gostas de fazer o que fazes. onde te tornas independente.
tens uma capacidade de pôr o mundo a girar, como ninguém.
de te movimentares.
de nos movimentar.
tens um coração do tamanho do mundo.
uma disponibilidade.
um sentido de humor.
uma energia que nos mantém acordados.
não desistes. não te cansas.
lutas como ninguém.
a tua filha só pode ter o maior orgulho na mãe que tem.
eu tenho.
na marida. na amiga. na mulher. e na mãe que agora és.
eu tenho o maior orgulho em ti.

Ainda tens todo o tempo do mundo.
pega nessas asas e voa.
voa porque é bom. porque faz bem. porque é preciso.
mas voa com cuidado.
voa baixinho. sobre a cidade.
sempre a olhar pelos teus.
não vás para as nuvens.
lá, perdes-te.
lá, és infeliz.
estive lá contigo.
e vi-te.
acredita em mim.

a marida ama-te muito.
isto também parece saído de uma novela.
mas não. aprendi contigo. não cai nenhum bocado, dizer o que se sente.