coisas pequeninas

coisas pequeninas que me fazem rir.
coisas pequeninas que me fazem voar.
coisas pequeninas que me fazem viver.

mas coisas pequeninas fazem-me chorar
coisas pequeninas atiram-me ao chão.
coisas pequeninas vão-me fazendo morrer.

que fácil é.
ir de um lado ao outro

mas estou tão cansada disso...

Lisboa que amanhece

briginha na ginginha - lisboa

"Cansados vão os corpos para casa
dos ritmos imitados de outra dança
a noite finge ser
ainda uma criança
de olhos na lua
com a sua
cegueira da razão e do desejo

A noite é cega e as sombras de Lisboa
são da cidade branca a escura face
Lisboa é mãe solteira
amou como se fosse
a mais indefesa
princesa
que as trevas algum dia coroaram

Não sei se dura sempre esse teu beijo
ou apenas o que resta desta noite
o vento enfim parou
já mal o vejo
por sobre o Tejo
e já tudo pode ser tudo aquilo que parece
na Lisboa que amanhece

O Tejo que reflecte o dia à solta
à noite é prisioneiro dos olhares
ao cais dos miradouros
vão chegando dos bares
os navegantes
amantes
das teias que o amor e o fumo tecem

E o Necas que julgou que era cantora
que as dádivas da noite são eternas
mal chega a madrugada
tem que rapar as pernas
para que o dia não traia
Dietrichs que não foram nem Marlenes

Não sei se dura sempre esse teu beijo
ou apenas o que resta desta noite
o vento enfim parou
já mal o vejo
por sobre o Tejo
e já tudo pode ser tudo aquilo que parece
na Lisboa que amanhece

Em sonhos, é sabido, não se morre
aliás essa é a única vantagem
de, após o vão trabalho
o povo ir de viagem
ao sono fundo
fecundo
em glórias e terrores e venturas

E ai de quem acorda estremunhado
espreitando pela fresta a ver se é dia
a esse as ansiedades
ditam sentenças friamente ao ouvido ruído que a noite, a seu costume, transfigura

Não sei se dura sempre esse teu beijo
ou apenas o que resta desta noite
o vento enfim parou
já mal o vejo
por sobre o Tejo
e já tudo pode ser tudo aquilo que parece
na Lisboa que amanhece"

Sergio Godinho


lisboa amanheceu em tantas histórias da minha vida.
amanheceu em sonhos.
cantando no interior da minha cabeça.
lisboa amanheceu nas minhas primeiras férias sozinha. comigo.
quando atravessava o tejo
a caminho de tavira. da ilha. sozinha.
as primeiras férias só comigo.
em que fiz um amigo. que coisa mais linda não há.
em que fiz outros.
em que fiz esta.
lisboa amanheceu em conversas.
em abraços.
em braços.
em beijos.
lisboa amanheceu em corpos.
tantas vezes amanheci em lisboa.
e adormeci.
tantas vezes levei o corpo cansado para casa.
mas feliz.

um abraço até ao fim dos dias para a minha mó

que seja tudo hoje, então.

não compreendem?
não conseguem fazer igual?
nem tão pouco concordam?

é hoje que vivo tudo como se não houvesse amanhã.

porque não há amanhã.
e a vida tem de me acontecer.