que seja tudo hoje, então.

não compreendem?
não conseguem fazer igual?
nem tão pouco concordam?

é hoje que vivo tudo como se não houvesse amanhã.

porque não há amanhã.
e a vida tem de me acontecer.

1 comentário:

Briginha disse...

e a vida tem de acontecer foda-se. um grito. vou dar um grito. consegues ouvir o meu grito? consegues gritar para que eu te ouça? quero que a vida me aconteça, te aconteça. por um momento não me queixo, dou apenas um grito. porque a vida que me acontece é só luta e dor. alguns momentos efémeros de pura felicidade, como as mãos na terra, o cheiro do jasmim e coentros, os olhos no mar aqui tão perto, este lugar onde te encontro e falas com as letras e me atenuas a carência de vida que às vezes sinto. trago cá dentro um cansaço extremo não é justo. desapareci do mapa para demasiadas pessoas importantes. perdi quase tudo, só ficou o que é umbilical, o incondicional na minha existência. não te apetece gritar? não te apetece largar tudo por um dia e viver à tua imagem, como se não houvesse de facto amanhã? aquela banda que um dia a elza me mostrou e da qual não me lembro do nome cantava assim: "é preciso amar as pessoas como se não houvesse amanhã, porque se você parar para pensar, na verdade não há". eu digo que preciso de amar e sentir o amor dos outros como se não houvesse amanhã. eu amo, amo demais. cheguei à triste conclusão de que a maioria das pessoas não sabe amar, nem sequer sabe a essência do amor. eu preciso de viver intensamente, sugar a vida. a vida tem-me sugado e não sei como se dá a volta a isto. já fui uma flor um dia, agora sou um mosquito, um micróbio, ou talvez nem seja coisa alguma. está-se tudo a cagar. para mim, para quem sou, o mundo caga-se me vez de se dar ao trabalho de ser criativo e carinhoso e me mostrar que gosta de mim. tu não, tu vais e voltas sempre, nunca me deixaste. estou a falar do mundo. tu ficaste quando a maior parte do mundo se perdeu, me esqueceu. e a vida acho que se esqueceu de mim. ou eu da vida.
tu dentro de mim a viver os dias como só tu os sabes viver, com toda a confusão e intensidade que fazem parte dessa mulher única que és. sabes viver, não me digas que não sabes viver porque a vida a ti lá te vai acontecendo.
e eu? o mundo gira lá fora, mas aqui dentro de mim a vida não acontece. agarro-me às pequenas coisas, sobrevivo porque as respiro. apanho pedras que trago para casa, para dentro do corpo para senti-lo mais vivo. fora de mim só acontecem desgraças, pequenas e grandes, que me cortam os passos, me sugam a energia e me fazem perder o trilho onde a vida acontece. não me quero queixar, não adianta nada só me entristece. não gosto de lamúrias. são chatas e nada construtivas. só servem para descarregar e nos lembrar a merda quenos acontece. estou-me a marimbar para choradeiras. quero gritar. deixar por um momento de ser diplomática e tolerante e compreensiva. gritar.
um dia morri. depois acordei e estava verde, tu disseste e era mesmo verdade. depois cansei-me de ficar parada a ver o meu corpo definhar. abri uma fresta na janela, saí para o mundo. estavas lá tu. recebeste-me, verde, cadavérica. e vi como era bom abrir uma fresta na janela e estares lá tu. e através de ti a vida aconteceu. depois dessa maravilha foi um ano indescritível em que ou os astros amalucaram ou alguém me lançou um mau olhado. sobrevivi. agora com tudo a ficar mais calmo, lá tento recuperar. numa mistura de solidão dolorosa com a profunda falta da solidão que me é essencial. contraditório? não, mas levaria algum tempo a explicar. estou só por dentro, sinto falta do amor das pessoas. mas falta-me o tempo para estar comigo. não importa. filosofias. no sábado fui passear a lisboa. andei nos nossos sítios. mandei-te uma foto da ginginha e falei-te da terra dos sonhos. andei a pé pela nossa terra dos sonhos e não sei para onde se pisgaram os nossos sonhos, mas os sítios estão lá. no miradouro da graça, depois de subir a encosta do castelo, sentei-me a beber uma cerveja. a esplanada cheia, fim de dia de verão, essa leveza. à minha frente, duas cadeiras encostadas ao muro. o muro a fazer de mesa para pousar copos e maços de tabaco, isqueiros. nas cadeiras duas raparigas. a beber cerveja e coca-cola. a falar a falar. muito juntas. a fumar cigarros, muito próximas. muito amigas, sentia-se. éramos nós. ficaram para ali no entardecer. imaginei como seria fácil se encontrarem ali, um telefonema, uma sms. tão rápido. como nós, na nossa terra dos sonhos há dez anos ou lá o que é já lhes perdi a conta. uma delas pousou a cabeça no ombro da outra. eu senti o arrepio, a profunda tristeza da falta do teu ombro no entardecer com lisboa aos meus pés. falta-me o teu ombro ao entardecer, à distância de uma caminhada ou um comboio. foda-se, estou só, não há o teu ombro na terra dos sonhos e se é assim então eu não quero crecer. isto não é um lamento. é um grito. posso gritar? queres gritar? eu queria dizer que é hoje que vivo tudo, como tu. mas não consigo viver tudo, como tu. estou presa a uma teia que nem sei identificar. dentro desta teia pelo menos o grito solta-se. e tu, tu vive tudo como se não houvesse amanhã, porque é assim que se tem de viver, eu acredito. eu ainda não me consigo mexer. mas vejo-te a viver daqui do outro lado da terra. vive o hoje como se. isso ajuda-me a não esquecer.
eu não sei o amanhã nem o vejo mais luminoso, talvez não exista, ou sabe-se lá o que irá trazer, por isso por favor, mexam lá esses cordelinhos para que a vida aconteça. porque eu sozinha não tenho sido capaz. e quem me dera que acontecesse contigo por perto.